23.4.07

A marcha dos pingüins

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As eleições presidenciais da Argentina, marcadas para 27 de outubro, já tem pretendentes declarados. Roberto Lavagna, ex-ministro da Economia, o insistente e corajoso ex-presidente Calos Menem e a deputada Elisa Carrió lançaram-se no início do ano. Mas a especulação em torno dos candidatos concentra-se sobre o casal da situação. O presidente Kirchner e a primeira-dama e senadora Cristina Fernandéz mantêm um joguinho de indecisão estratégica. Esperam a opinião pública manifestar-se mais explicitamente para decidir quem entra na disputa, apesar das pesquisas apontarem à vitória dele e dela, se o pleito ocorresse hoje.

Néstor Carlos Kirchner se tornou presidente da Argentina depois da desistência de Menem, que ganhou no primeiro turno com 24,3%, mas jogou a tolha quando percebeu que 75% dos argentinos têm calafrios ao ouvir seu nome. Kirchner militou na Juventude Peronista e foi governador da província de Santa Cruz, última antes da Terra do Fogo. Ele e a esposa – “el pingüino y la pingüina”, como dizem os argentinos – dirigem uma série de empreendimentos na Patagônia, e integram o Partido Justicialista, fundado por Juan Perón.

Kirchner carrega consigo fortes traços do ex-presidente. Com um discurso em tom populista e nacionalista, rechaçou um novo acordo com o FMI, dizendo que a Argentina não deve dobrar-se às receitas de política econômica que vêm anexadas aos empréstimos de fora. A guinada à esquerda também inclui a defesa dos acordos com a Venezuela e a encrenca feia com Tabaré Vasquez, presidente uruguaio, em função da indústria de celulose que será implantada na fronteira entre os dois países, nas margens do rio da Prata.

O caráter peronista de Kirchner é tão evidente que o presidente arrastou a esposa como extensão da personalidade política. Se Cristina vence as próximas eleições, Kirchner certamente voltará na próxima corrida e pode emplacar 12 anos de comando. A pretensão de agarrar o poder com unhas e dentes não é novidade. Eleito governador de Santa Cruz em 1991, conseguiu reformar a legislação estadual para permitir a reeleição ilimitada. Resultado: venceu três vezes consecutivas.

Só para recordar, Perón lançou Evita como candidata a vice-presidente quando tentava a reeleição, em 1952. Porém, foi pressionado pela extrema direita da época a abrir mão da idéia para manter a estabilidade política. Por isso, contentou-se em colocá-la no posto de Ministra da Assistência Social. Mas isso não é tudo. Depois do terceiro mandato, que encerra com sua morte, quem assume a presidência é nada menos que Isabel, sua terceira esposa e vice-presidenta eleita. O mandato foi um caos e acabou interrompido pelo golpe militar de 24 de março de 1976.

A semelhança, a meu ver, é clara. Tanto na forma de se dirigir aos eleitores, com discursos inflamados e cafonas, quanto nas estratégias, concentrando poder de decisão e fazendo da esposa uma extensão política. Kirchner revela ser mais peronista que qualquer outro. E a marcha dos pingüins segue até outubro.


Foto: Wikipedia

3 comentários:

Iuri Lammel disse...

A semelhança, a meu ver, é clara. Tanto na forma de se dirigir aos eleitores, com discursos inflamados e cafonas, quanto nas estratégias, concentrando poder de decisão e fazendo da esposa uma extensão política.

Tal como Lula imitando Vargas em algumas situações (lembram da mão suja de petróleo?), ou comparando-se a JK em seus discursos.

Juntando tudo isso a Chavez... estamos voltando à época dos governos populistas na América Latina!

Augusto Paim disse...

Tchê, flor de especial teu blog.

Só uma sugestão (eu levei mais de ano pra me dar conta): destaque mais os links do teu blog. Eu usava antes um verde claro sobre um fundo verde escuro. Aí troquei para um amarelo. Fica bem melhor. Como teu fundo é branco, pega uma cor escura pro link: preto, azul escuro... Ou as cores que o próprio blogger usa (só olhar aí ao lado): laranja, outro tom de azul...
Abraço.

Anônimo disse...

Nao eh mito esta afirmacao de que 75% dos argentinos têm calafrios ao ouvir o nome de Menem. Aqui eh palavrao mesmo. Com a memória que os argentinos tëm (e todas as suas razoes), eles se referem a Menem como "a palabra prohibida".