28.9.07

A Cruzada dos neopentecostais

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Cutucar o fígado da Rede Globo até a emissora cair do trono: meta estabelecida pelo papa eletrônico Edir Macedo. Alguém duvida que ele triunfará? Tendo Deus como principal sponsor tudo fica mais fácil. Ontem foi dia de lançamento da Record News, canal aberto de notícias 24 horas. Em questão de meses, o grupo comunicacional pastoreado pelo bispo famigerado arrematou uma porção de veículos no Rio Grande do Sul. A TV e a rádio Guaíba, o centenário Correio do Povo e a TV Pampa de Santa Maria foram as maiores aquisições dos investidores do Todo Poderoso.

Ainda em Santa Maria, os sacerdotes midiáticos flertam, em um negócio misterioso, com os donos de A Razão, jornal com mais de 70 anos de história e que já foi de Chateaubriant. Pediram o levantamento técnico do que vale a estrutura setuagenária e puseram jornalistas da TV Record na redação. Fala-se em parceria. Os antigos diretores continuam, mas mudanças estruturais na empresa comandada pela família De Grandi indicam que a negociação avança.

A imprensa, que tanto bateu na Igreja Universal, já está, em grande parte, na mão dos assistentes neopentecostais de Cristo. Eles pagam o salário de milhares de jornalistas e editam um número incontável de periódicos e noticiários. Em vez de combater, arrebanharam as ovelhas negras.

A Record News trouxe consigo a provocação mais direta que alguém já deve ter feito ao império Global. Fica um conselho do signatário deste blog ao conglomerado dos Marinho: não despertem a ira divina, “Amai aos vossos inimigos, e orai pelos que vos perseguem” (Mateus 5:55).

20.9.07

A saudade meridional

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Toda vez que cruzo o rio Uruguai e ando por ruas argentinas, tenho a impressão que voltei no tempo. Enxergo o Brasil de 1970, mesmo sem ter vivido esta década. Já cheguei a pensar que é proposital por parte deles. Parece que a nação governada por Kirchner não aceita a dura realidade econômica e os problemas sociais que lhes castiga hoje. Há uma saudade, apesar do vocábulo não constar no léxico castelhano.

A eleição vem chegando e tenho uma sugestão àquele que pretende ocupar a Casa Rosada. A promessa que garante a vitória é: “No meu primeiro dia de governo, colocarei todos em uma máquina do tempo e voltaremos a 1955. Darei férias eternas, no caribe, aos generais golpistas e vou garantir uma bolsa de estudos, em Hanói, ao garoto Carlos Menem”. Pronto, os tempos áureos, dos quais se orgulham e evocam frequentemente, estariam de volta.

Talvez ufanar-se do passado seja costume dessa gente do Sul do mundo. Essa dificuldade de apear do cavalo, de se resignar com a guaiaca vazia, de baixar a aba do chapéu é comum também no Rio Grande do Sul. Os últimos anos têm sido duros para a unidade federativa que já teve o maior Índice de Desenvolvimento Humano do Brasil.

Hoje é 20 de setembro, dia em que se comemora a tomada de Porto Alegre pelas tropas da Revolução Farroupilha em 1835. Chove em todo o Estado. O padroeiro dos gaúchos não acordou de bom humor e encharcou bombachas e vestidos. Nem assim perdeu-se a oportunidade de laçar o passado e fazer de conta que o Rio Grande ainda é pujante, rebelde e rico. O peão da indústria que faliu quer voltar a ser peão de estância. O caminhão do desfile quer se transformar em carroça. O piquete quer seguir cavalgando no final da avenida e declarar guerra.

Que drama! Encarar mais de R$ 17 bilhões de dívida pública não é fácil. Dificilmente as lanças, mosquetes e carabinas ajudariam.



Sou gaúcho forte, campeando vivo

Livre das iras da ambição funesta;

Tenho por teto do meu rancho a palha,

Por leito o pala, ao dormir a sesta.

Monto a cavalo, na garupa a mala,

Facão na cinta, lá vou eu mui concho;

E nas carreiras, quem me faz mau jogo?

Quem, atrevido, me pisou no poncho?

João Simões Lopes Neto



Fotos: 1) Gaúcho argentino do site http://www.oyitas.org.ar/; e 2) Batalha de Farrapos é um óleo de José Wasth Rodrigues que está na Pinacoteca Municipal de São Paulo.

13.9.07

E se fosse eu? (versão ilustrada)

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Colaboração do publicitário e ilustrador Sérgio Alberto Righi encomendada pelo Polipoliticus.

E se fosse eu?

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A empatia triunfou. Viva a solidariedade!

Ontem, foi dia de se imaginar na pele de Renan. A mídia esperneou, mas nada substitui o “pai crítico”, aquele corregedor interno e subjetivo, no pé do ouvido. Afinal, a secretária, a balconista, a sobrinha ou a colega poderia ter feito o mesmo que fez a jornalista. O Gonçalves e o Gonçalo, grandes companheiros, poderiam ser o Gontijo. A implicância poderia ter sido com as cabritas ou com as capivaras, em vez dos terneiros.

A auto-análise e a imagem que os senadores (aqueles que votaram contra a cassação) têm de si mesmos não lhes permitiu abrir o cadafalso. Quem absolveu o presidente do Senado ouviu o “pai crítico” (alguns o chamam de consciência) argumentar, lá das profundezas das notas frias e laranjadas: Aquele que nunca pecou que atire a primeira pedra. Quem é vossa excelência, malandro fino, para condenar seu par?

Para aqueles que votaram a favor da perda do mandato, restou uma dúvida:

O que é que vou dizer lá em casa?



Foto: www.anuleseuvoto.com (charge "ambiente de trabalho no Congresso")

1.9.07

Quem tem cargo tem medo

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Alguns ovacionaram a repórter Vera Magalhães pelo oportunismo (no bom sentido). Enquanto outros se puseram no lugar de Lewandowski, o ministro pilhado, repudiando a técnica utilizada na reportagem que rendeu manchete na Folha de São Paulo da última quinta-feira: "Tendência era amaciar para Dirceu", diz ministro do STF.

O ouvido atento da jornalista e a minuciosa descrição, com detalhes do cenário em que tudo aconteceu, não deixaram margens para que o magistrado do STF negasse o diálogo que a reportagem narra. Vera sabia muito bem da relevância das informações que ouvira e disse que se sentiu gratificada com a grande repercussão do texto.

A crítica do ombudsman do jornal, Mário Magalhães, apoiou a decisão da Folha em publicar a matéria. Segundo ele, o ministro exerce função pública, estava em um lugar público e as informações em jogo eram de legítimo interesse público.

Entretanto, Lewandowski não foi ouvido na apuração de Vera Magalhães. Fiquei imaginando o susto do ministro quando leu o jornal. Estampado no periódico de maior circulação nacional a marca do vinho que tomara e o clip que tocara às suas costas no restaurante em que estivera na noite anterior.

O outro lado só veio no dia seguinte. De uma extensa entrevista, destaco o trecho: "[No telefonema no restaurante] eu estava com a minha esposa, com quem sou casado há 30 anos. Nunca vi o Kakay [citado na matéria]. Informar o vinho que eu tomei, o que eu comi... Amanhã a imprensa estará fuçando no meu lixo para saber que tipo de remédio estou tomando. Se isso acontecer, é um país onde eu não quero viver e onde não gostaria que os meus filhos vivessem, em que a invasão de privacidade chega a este nível".

Quem delimita a vida pública e privada? Até onde se pode ir? Não consigo argumentos fortes para discordar do ombudsman, tampouco de Lewandowski. Só temos certeza de uma coisa: depois da última quinta-feira, tem gente em Brasília sussurrando até para pedir Coca-Coca.