23.7.07

Que é peronismo?

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Provavelmente poucos se atrevem a responder imediatamente. Nem mesmo as explicações complexas da academia argentina dão conta de esgotar esse fenômeno político-social-histórico que permeia o país desde 1944. Foi nesse ano que o coronel Juan Domingo Perón, um dos líderes do regime militar implantado em junho de 1943, começa a se destacar como diretor do Departamento Nacional do Trabalho. Um posto que lhe rendeu uma popularidade ímpar e possibilitou sua eleição em 1944, com a redemocratização da Argentina. Foi a gênese de um processo que dividiu o país em ANTES e DEPOIS de Perón.

O regime implantado sob o comando do novo presidente em 1946 tinha suas idiossincrasias. Perón sustentava amplo apoio da massa operária e tentava estabelecer um cenário unânime, sem oposição, sem pluralismo. O primeiro mandato (1946 – 1950) seguiu a fórmula de “Comunidade Organizada” que consistia em uma união policlassista sob os olhos do governo, na qual o Estado operava como intermediário na relação entre a organização dos empresários e a central sindical. Já o segundo mandato, para o qual se reelegeu em 1950, foi interrompido em 1952 pela Revolução Libertadora, organizada pelas forças armadas e setores civis opositores (partidos menores e Igreja Católica). Lá foi Perón para o exílio do qual voltaria somente em junho de 1973.

Ao retornar, Perón concorre ao lado de Isabel, sua segunda esposa, e vence mais um pleito. Mas a Argentina não era mais a mesma, nem o peronismo, que se encontrava dividido entre direita e esquerda. Burocratas sindicais representavam os destros, enquanto a Juventude Peronista conformava os blocos canhotos, revolucionários, socialistas, guerrilheiros. O retorno do grande líder – em 20 de junho de 1973, no aeroporto de Ezeiza, em Buenos Aires – revelou o clima interno do movimento. Os setores opostos lutaram por espaços próximos ao palco em que discursaria o "pai adorado". O empurra-empurra se transformou em troca de tiros que resultou em aproximadamente 13 mortos e 365 feridos. Uma situação contraditória e paradoxal. Todos peronistas, mas inimigos políticos. A ruptura no movimento se mostrou irreversível e, ademais, recrudesceu com o passar do tempo. O grande líder, já debilitado fisicamente, morreu menos de um ano depois, transformando-se em mito.

E hoje, quem são os peronistas? A grande maioria dos atores políticos de relevância na Argentina é do Partido Justicialista (PJ), fundado por Juan Perón em 1946. Entretanto, muitos são opositores entre si e brigam pela herança (popularidade e votos) do casal eternizado no imaginário coletivo (Perón e Evita). Cada corrente faz a sua interpretação do movimento, o que resulta em direitistas e esquerdistas que se dizem peronistas, tal qual na década de 1970. A falta de consenso é tão grande que em 2003 a Justiça permitiu que três candidatos concorressem à Presidência argentina pelo partido P A R T I D O. O ex-ministro da economia do atual governo e candidato a presidente Eduardo Lavagna é peronista, Menem é peronista, Kirchner e Cristina também são. Não se entendem nem para eleger a direção do PJ, que está sob intervenção judicial desde 2005, muito menos para escolher um candidato único ao pleito presidencial de outubro.

A idéia do grande líder carismático e populista era simples: A Argentina deve ser peronista. Patrões e empregados, liberais e comunistas, jovens e velhos, torcedores do Boca e do River. Com esse intuito, Perón, orador hábil e eloqüente, dirigia seus discursos para todos. A ambigüidade e amplitude de suas posturas permitiram que arrebanhasse uma enorme parte da nação. Para ele, quem era antiperonista era antipátria.

Obviamente, não deu certo. Uma democracia não pode e não deve ser unânime, a oposição é salutar e o pluralismo de forças e opiniões é bem-vindo em um regime que respeita a liberdade civil e política. Os descontentes precisam ter vez para bradar, chance para opinar. Se não, estouram de forma menos civilizada.




Foto: Wikipédia

2 comentários:

Leonardo disse...

Cara, que bagunça esse peronismo...

Menos mal que por aqui não se tem um Partido Justicialista, embora, por vezes, esse problema de ter destros e canhotos (legal falar com esses termos, suaviza os sempre Direita/Esquerda)também é visto no PMDB.

Augusto Paim disse...

O PT tem semelhanças com o peronismo?